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'Apetite para risco e menos ego são receitas de sucesso', sugere Andreas Blazoudakis

Apetite para o risco e menos ego. Para o fundador e CEO do Delivery Center, Andreas Blazoudakis, essa é uma das receitas para os empreendedores que querem criar um negócio de sucesso. “Eu vendi a minha casa quando criei a Movile e, recentemente, construí um prédio para provar aos shoppings que o Delivery Center era um bom negócio”, conta. O empreendedor criou 17 startups, entre elas a Movile, avaliada em mais de US$ 1 bilhão em 2018 e investidora de empresas como iFood e Ingresso Rápido.



Blazoudakis é o segundo convidado desta temporada do Mentes Transformadoras. A série de vídeos e podcast entrevista personalidades sobre o cenário atual do mercado, os novos modelos de negócios que estão surgindo e os desafios deste mundo cada vez mais conectado.


Jornal do Comércio – Você costuma citar com naturalidade os cases de startups que você criou e que não deram certo. Como funciona essa cultura do erro e do acerto no mundo de hoje?


Andreas Blazoudakis – Inovar é muito apaixonante. Você se apaixona pela ideia e é ela que faz a inovação ocorrer. Mas, aquela mesma ideia, também pode destruir porque, se o projeto tem imperfeições e você não enxerga, por estar apaixonado por ele, pode errar por muito tempo. Tenho 30 anos de tecnologia e errei bastante. No meu primeiro projeto, levei seis meses para desenvolver, gastei R$ 5 milhões e fiquei mais seis meses até assumir que estava errado. Isso acontece muito. As grandes empresas geralmente selecionam os seus principais executivos, deslocam eles para um projeto e, morrendo de medo, fazem dois a três meses de planejamento. E, só então, começam a colocar em prática. A inovação perfeita não deve ter muito planejamento. O que tenho feito nos projetos agora é: pouco planejamento, execução rápida, medição de resultados e planejamento em cima do que foi conquistado.


JC – Qual é a receita de sucesso para um negócio decolar?


Blazoudakis – Apetite para risco e pouco ego. Fiz muitas coisas que deram certo, mas muitas mais que deram errado. Participei da criação de dois unicórnios, a Movile e o iFood, e espero que o Delivery Center seja o terceiro. Nas empresas que deram muito certo, um componente foi crucial: a inovação depende da cultura de equipe, e de menos ego. Buscamos estes valores no nosso time. A inovação é da célula, não de uma pessoa só. Toda vez que alguém começa a ter propriedade sobre a ideia, ela não vai para frente porque é o fulano sozinho trabalhando. Outra característica importante é ser capaz de arriscar.


JC – As empresas estão entregando os produtos e serviços que os consumidores atuais estão demandando?


Blazoudakis – Há uma grande divergência entre o que muitas das empresas estão pensando e fazendo em relação ao que o consumidor realmente quer. Vejo as empresas inovarem muito mais no quesito evolução, que é aumentar 10% produtividade ou diminuir 10% o custo de produção. Mas o consumidor não está orientado para este tipo de inovação. O consumidor moderno está precisando de inovação disruptiva. Ele realmente quer coisas que baixem o preço 90% e que o que era pago seja gratuito. Antes ele levava dez minutos para chamar um táxi e hoje ele espera que o carro chegue em um minuto. A tecnologia já existe há bastante tempo e vem melhorando de forma evolutiva, com 10%, 20% a 30% ao ano. O celular é o grande herói dessa transformação. O fato do celular ter virado tão popular e de dentro dele existir um GPS foi o fator que habilitou a maioria das empresas que estão virando unicórnio nessa área. Você tendo celular na mão das pessoas e com uma série de serviços, consegue criar coisas muito disruptivas.


JC – Você vem estudando há muito tempo a conexão entre o on-line e o off-line. Como o encontro destes dois mundos pode turbinar os negócios?


Blazoudakis – Estou desde 2010 pesquisando o impacto do digital no consumidor moderno. Da Ásia vem esse movimento de ligação do mundo on-line e off-line. Se você olhar, até alguns anos, as empresas digitais viviam essa transformação do mercado, mas o mundo real não participava disso, do motorista de táxi ao comércio da cidade. Mas, quando ligarmos as potências do on-line com o mundo off-line, começaremos a ter serviços urbanos que não existiam até então. Se você parar para pensar, o e-commerce existe há uns 20 anos no Brasil e tem uma penetração de 5% na economia, algo como R$ 100 bilhões. A Associação Brasileira Online to Offline (ABO2O) fala que o on-line vai partir já de R$ 1 trilhão, cinco vezes mais nos próximos anos, só por essa conexão do mundo on-line e off-line. Isso é muito novo, não só no Brasil, mas também na China. Os Estados Unidos estão na mesma etapa do desenvolvimento que o Brasil está. Pela primeira vez, estamos no mesmo ritmo com o que está sendo feito neste aspecto da conexão on-line e off-line aqui e nos EUA.


JC – Nos acostumamos nas últimas décadas e sempre buscar referências de inovação nos Estados Unidos. Mas, isso tem mudado. O que a China tem a nos ensinar?


Blazoudakis – De um tempo para cá, o mercado começou a trazer inovação da Ásia porque é lá que existem situações parecidas com as vemos no Brasil, como cidades mais verticais, trânsito mais confuso, cidades muito populosas e muita divergência de poder aquisitivo. Começamos a olhar para a Ásia, e hoje o mercado está indo muito na direção do que está sendo feito lá. A ligação do on-line com off-line é muito bem feita lá.


JC – Qual é o maior desafio de uma grande empresa ou até mesmo um setor tradicional se transformar hoje em dia?


Blazoudakis – Os grandes desafios para as grandes empresas se transformarem são as amarras dos paradigmas. As corporações que existem há um bom tempo e que alcançaram um certo porte têm uma série de processos e métodos de como resolver os problemas, e é muito difícil quebrar isso. Muitas vezes são as pessoas da própria companhia, que não estão amarradas nestes problemas atuais, que criam as soluções novas. São elas que quebram as amarras. Inovar, fazer algo diferente, gera temor.

JC - Qual é o formato ideal para estimular a inovação nas empresas? Ter uma área interna, com o próprio time, ou criar uma estrutura apartada?

Blazoudakis – O modelo que deu mais certo na minha trajetória foi sempre quando criei estruturas separadas do dia a dia da operação. Quando você pega os seus melhores executivos e os coloca para criarem coisas novas, você acaba amarrando eles à hierarquia da empresa, e eles não conseguem fazer as ações necessárias, pois estão presos ao resultado. Outra coisa importante é evitar hierarquias. Esse modelo dá certo porque quando você cria uma estrutura apartada, que não tem compromisso com as metas atuais da empresa e nem com a hierarquia atual, ela vai lá e desafia uma nova de resolver o problema e a própria empresa. Muito melhor ser desafiado internamente do que esperar a concorrência desafiar você.


JC – Inovar hoje em dia é mais fácil que no passado?


Blazoudakis – Por um lado, é bem mais fácil. Quantas ferramentas e tecnologias temos hoje? E todo ambiente formado pelas aceleradoras, startups e incubadoras que não existia há dez anos. Existiam iniciativas nos Estados Unidos e em outros países, mas aqui não. Nesse sentido, não existe mais barreira regional. Uma inovação que é feita no outro lado do mundo chega em questões de dias aqui. Mas, se inovar está mais fácil pelas ferramentas disponíveis, por outro lado está muito mais difícil pela competitividade. Na hora que estamos criando um produto hoje, temos certeza que tem mais 10 ou 20 sendo criados no mesmo momento.


JC – Por que o Brasil não consegue criar startups com produtos e soluções escaláveis, para serem usados no mundo inteiro?


Blazoudakis – O Brasil não tem o porte suficiente para segurar um Facebook ou WhatsApp local. China e Índia tem população na casa de 1 bilhão e os EUA têm poder econômico. Nossa economia é grande, mas não o suficiente para suportar um produto desses. Quando a gente pensa regionalmente, temos a América Latina, mas esse mercado é extremamente difícil de trabalhar como região. Falta também um pouco de estratégia dos empreendedores locais criarem algo já pensando em mercado global. Temos boas ideias, mas não podemos ficar restritos ao mercado brasileiro.


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